A força para fazer crescer o Corfebol – Entrevista a Mário Almeida

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    Mário Almeida, presidente da Federação Portuguesa de Corfebol, esteve à conversa com o Bola na Rede e abordou vários temas, como o que falta fazer no Corfebol, as dificuldades sentidas e o próximo Europeu, que se vai realizar em Portugal.

    Bola na Rede: O Corfebol é uma modalidade que ainda está muito dentro de Lisboa. Que medidas é que a Federação tem tomado para mudar esta situação?

    Mário Almeida: O Corfebol foi introduzido em Portugal há 32 anos. Nasceu na Faculdade de Motricidade Humana (ISEF na altura) e foi por um motivo esporádico. A Faculdade estava à procura de novas modalidades pois estava muito focada no basket, voleibol, andebol e no futebol. Decidiu apostar em três ou quatro modalidades novas sendo que muitas não vingaram. Estas modalidades foram entregues a professores catedráticos, sendo que ao Mário Godinho calhou esta e ele agarrou-se muito ao seu desenvolvimento. Os professores, ao formarem-se, criaram o Agon Clube de Portugal e começaram a fazer jogos entre si. Quando começaram a dar aulas mantiveram-se quase todos na área de Lisboa e por isso a modalidade fica muito por aqui. Fizeram-se algumas investidas com êxito, como as idas a Bragança, Batalha, Leiria, quase com os postes às costas. O problema é que estes clubes que surgiram nestas cidades só conseguiam competir em Lisboa, duraram um ano ou dois – pois vir ao fim-de-semana de Bragança e voltar a Bragança para fazer apenas um jogo não é rentável a nível financeiro, ou seja estas equipas morreram -, embora tenham permanecido por lá professores amantes da modalidade. O professor Mário Godinho, e por isso mesmo lhe prestamos homenagem com a Supertaça, faleceu, no dia 12 de novembro de 2008. Desde a sua morte, a Federação ficou à deriva. Era ele quem tinha, desde as suas raízes, maquinado a Federação. Ao fim de três anos, houve uma reviravolta na Federação e eu acabei por abraçá-la, sendo que com características diferentes. Eu não sou professor de Educação Fisíca, nunca joguei Corfebol na vida e trouxe também para a Federação outra pessoa apenas para a Gestão, porque entendemos que a forma de dar a volta a isto era gerir a modalidade como uma empresa, abordar as questões de marketing, de logística, etc. Sendo certo que os atletas e a maioria dos professores de Educação Física continuam a ter bons skills para a prática da modalidade, esta não era a nossa preocupação, a nossa preocupação era expandir a modalidade. Hoje, passados dois anos, temos ainda um longo caminho a percorrer, pois estas mudanças não se fazem em apenas dois anos. Já temos uma delegação no Porto, temos diretores de responsabilidade regional em lugares específicos, como é o caso de Chaves, responsável pelo Nordeste transmontano; do Fundão, responsável pelas Beiras e pelo Algarve. Neste momento, sim, existem vários clubes em Lisboa, tendo nascido mais três clubes este ano, um facto notável dado os tempos em que vivemos, portanto temos condições para esperar que as coisas vão ter um progresso interessante.

    BnR: O que é falta para continuar a melhorar no corfebol?

    M.A: Nós temos duas dificuldades grandes, quando estamos a falar na diversificação e na distribuição pelo país. É preciso dar formação em todo o país e, como existe esta concentração toda em Lisboa, é preciso deslocar as pessoas aos sítios. Este é o grande problema, porque nos faltam recursos humanos centralizados que nos levem a cabo esta preparação. A segunda questão é que nós precisávamos de transformar as nossas escolas no corfebol. Aqui existe uma contradição incrível: todas as nossas escolas têm equipamento de corfebol, só que como não existiu durante anos esta predisposição para divulgar o corfebol, os professores de Educação Física – quase todos eles sabem como se joga o corfebol – não o praticam nas escolas, embora tenham o material. Esta é a nossa segunda frente, o ambiente escolar. Temos uma estratégia muito agressiva, vamos ver os resultados que produz, mas também, mais uma vez, é uma coisa para demorar alguns anos. O problema destas coisas é que nós estamos a lidar com pessoas, isto não é como construir um prédio, em que basta adicionar mais trabalhadores. Estas pessoas, para serem bons atletas, têm de começar aos 12 para serem bons internacionais aos 20.

    BnR: O Euro 2014 vai ser aqui em Portugal. Quais as expectativas?

    M.A.: Esta Supertaça marca o início da temporada do Europeu. O Euro começa exatamente daqui a um ano na Maia. As minhas expectativas são altas. Como se desenvolveu esta modalidade graças aos professores de Educação Física, estes foram os primeiros grandes atletas internacionais e isto criou uma geração que tornou Portugal uma das potencias do corfebol. Estamos atualmente no quarto lugar. Se retiramos o contexto da Holanda, que tem uma situação completamente diferente, estamos em terceiro lugar em 60 federações. As nossas aspirações (não gosto de dizer isso sem a nossa selecionadora presente) é um lugar no pódio, nós já fomos terceiros classificados do Campeonato do Mundo. A nossa convicção é a de que consigamos trazer alguma coisa de valor. Escolhemos a Maia por ter sido nomeada Cidade Europeia do Desporto em 2014, o que nos cria uma canalização de recursos, de imprensa e de divulgação que nos favorece muito; em segundo lugar a Maia fica perto do Porto e há aí uma estratégia muito sólida neste momento e a existência de um Euro que transporta 16 equipas das melhores do mundo, com 400 atletas, durante 10 dias movimenta um potencial enorme de ações que se podem fazer. A nossa convicção é a de que podemos sair dali muito honrosos, apesar de haver quatro equipas que podem concorrer ao terceiro lugar: Ingleterra, Alemanha e República Checa. E talvez a Catalunha. Na China, no Campeonato do Mundo, acabámos em sétimo lugar por uma diferença mínima porque estas equipas são muito equilibradas. Temos dificuldade em alcançar mais pois a grande favorita, Holanda, apresenta um nível muito superior ao resto das equipas. São profissionais, treinam todos os dias do ano, os atletas que fazem parte da seleção holandesa praticam a modalidade desde os seis anos, tendo 20 anos de modalidade. Os nossos, e os dos outros países, começam pelos 12 anos, quando não é mais tarde. De maneira que produzimos um trabalho intenso, principalmente quando trabalhamos com os holandeses – vamos fazer dois estágios com eles – mas os nossos adversários são os que referi.

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    Fonte: jogadadomes.com

    BnR: Disse que nunca esteve ligado ao Corfebol, nunca foi atleta. Qual foi a motivação para abraçar o projeto da Federação?

    M.A: É uma história engraçada. Eu tenho dois filhos que estão ligados ao corfebol e que me obrigavam a acompanhá-los no corfebol desde há sete anos para cá, de maneira que acabei por me aproximar da modalidade e, como gestor empresarial que eu sou, acabei por observar o que estava fora do campo, as poucas audiências, o pouco crescimento das equipas e reparei que o corfebol precisava de um impulso estrutural. Basicamente a vocação foi esta: criar mecanismos que dessem um impulso à modalidade. Não foi muito fácil, principalmente ser aceite, porque esta comunidade é muito coesa. Por exemplo, quando um indivíduo se muda para uma aldeia é complicado porque os habitantes da aldeia não aceitam bem a mudança e eu senti esta resistência inicial. Eu queria engrandecer a Federação, que neste momento tem um quadro orgânico muito mais complexo mas todo ele virado para o crescimento. O que é que ainda nos falta mais? Falta-nos dinheiro. Vocês sabem que o movimento associativo está muito pressionado pelas quedas orçamentais. Para vos dar uma ideia, nós somos financiados pelo Estado com menos dinheiro do que aquilo que éramos há oito anos atrás. O que é facto é que as medidas restritivas no Orçamento foram grandes ao longo deste tempo todo e isto transporta muita incapacidade à máquina para poder contratar pessoas, nem que sejam meros estagiários profissionais que têm obviamente benefícios fiscais, mas que custam algum dinheiro. É sempre algo que iria ser importante em muitas regiões, mas que está cortado. Na publicidade da modalidade, acho que os números apontam que 98,2% dos canais de televisão se dedicam ao futebol e o resto dedica-se às outras modalidades. São 127 horas de média por semana de futebol na televisão. Vocês vêem, ao mesmo tempo e em dias consecutivos, comentar o espirro que o Jorge Jesus deu durante um jogo e é todos os dias isso e entretanto estão a decorrer os campeonatos nacionais de outras modalidades. É um bocado como a NBA e o futebol americano: eles disputam o tempo de antena, mas, se aparecer outra modalidade, fica num canto porque os outros saturam os media por serem investimentos viáveis: é um bocado como a história do corfebol. Julgo que temos um valor característico, não existe nem uma ponta de violência, apesar dos choques e lesões e é misto. Nós admiravelmente, somos um país para isto: existem quatro árbitros femininos a nível mundial, dois deles são portugueses. Em 70 árbitros, existem quatro senhoras e duas são portuguesas: a Carla Antunes (árbitro da supertaça) e a Isabel. Mas o António Pinho Vargas (cantor/compositor) tinha uma frase extraordinária – “Como se pode gostar de uma canção que não se ouve?” e a mesma coisa se aplica à modalidade. Como é que alguém que nunca viu corfebol pode praticar e gostar da modalidade? Esta é uma questão de responsabilidade social, em que o governo devia impor restrições sérias, como existem em alguns países – a cota do futebol é de 50%, quer seja em canais públicos, quer seja em privados. Podia ser proporcional ao número de atletas, ao número de clubes, e multar quem não cumprisse. O potencial que isto dava… Até de futsal, de que toda a gente fala, dá um jogo por semana, enquanto que de futebol dão jogos de todo o mundo e depois não passam as modalidade nacionais. Outra característica é o preço necessário para a prática desta modalidade, que é muito pequeno: dois postes e as bolas necessárias para a criação de um clube, jogar e treinar custa 400€. Uma tabela de basquetebol custa 2500€, portanto quer dizer que nem financeiramente é um handicap, mas com toda a actividade que nós tentamos desenvolver, não temos nem fundos nem recursos humanos. Estamos a lançar um projeto: “Corfebol Para Todos”, destinado a pessoas com deficiências, um um projeto ambicioso que cobrirá a Trissomia 21 e os Surdos. Temos uma professora responsável, Alexandra Frias, e queremos dinamizar a participação.

    BnR: Tal como já aconteceu no passado, existe alguma hipótese de vermos uma final da Taça de Portugal ou Supertaça na televisão?

    M.A: Os canais de televisão aceitam facilmente transmissões se o conteúdo for de borla, se metermos aqui uma produção e oferecermos ao canal para eles transmitirem, só que esta produção custa uns milhares de euros. Os novos canais, como A Bola TV e Benfica TV, são distribuidores, precisam de pagar para ter o conteúdo. Por exemplo n’A Bola TV, se lhes oferecermos o filme da final da supertaça eles passam e ainda nos deixam colocar publicidade no rodapé. No Campeonato da Europa vamos fazer este esforço, mas um contrato para os 10 dias do Europeu custava à volta dos 127 mil euros. Não tenho dúvidas de que a Sport TV passava alguns jogos se nós oferecêssemos os serviços. Não tenho dúvidas de que se aparecêssemos na televisão íamos ter mais atletas, mas isto custa dinheiro e não há.

    Entrevista realizada por:

    André Conde

    Rodrigo Fernandes

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