A extinção do número 10: Sobreviventes na Primeira Liga

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    «Nos tempos de Diego Maradona e Ronaldinho Gaúcho, as marcações eram como desse mais jeito na hora. Estes magos tinham o tempo necessário para definir a jogada da forma que queriam e faziam-no muito bem, ainda hoje sem igual.»

    Numa altura em que se defende o regresso das discussões só sobre futebol, haverá na Primeira Liga algum exemplar daquele que trata a bola e o jogo como ninguém?

    Ser um “número 10”, no verdadeiro sentido da palavra, é muito mais que vestir a camisola com esse número. Numa análise mais prática, vesti-lo até nem significa nada, como se vê pelo caso de Guillermo Ochoa, guarda redes mexicano do Standard de Liège, que veste a camisola oito, invulgar para a sua posição. Ser o “número 10” é conferir à sua equipa imprevisibilidade, omnipresença no meio campo e nota artística, como diria Jorge Jesus. Numa recente entrevista à imprensa alemã, James Rodriguez lembra a passagem pelo FC Porto e como foi encostado às linhas, rematando, com alguma tristeza, que o “número 10” acabou, já não tem lugar no futebol

    A evolução constante do futebol dá origem a novos conteúdos e elementos integrantes do jogo, mas também dita o fim de outros e o “número 10” parece não ter sobrevivido. O reforço do meio campo com médios corpulentos (Yaya Touré, por exemplo) para libertar os médios criativos de preocupações defensivas (Kevin De Bruyne, por exemplo) é uma solução muito recorrente nos dias que correm e que beneficia ainda da enorme projeção ofensiva dos defesas laterais. Veja-se a relação que tem Paulo Dybala com os defesas laterais quando atua como centro campista da Vecchia Signora.

    O jogo evoluiu ao nível físico, mas essencialmente ao nível tático. Hoje, as marcações são “ao homem”, “à zona” ou “mistas”. Nos tempos de Diego Maradona e Ronaldinho Gaúcho, as marcações eram como desse mais jeito na hora. Estes magos tinham o tempo necessário para definir a jogada da forma que queriam e faziam-no muito bem, ainda hoje sem igual. Mas será que este papel foi excluído do futebol, em particular do português?

    Yacine Brahimi é o artista que mais pinceladas de magia aplica na boa época dos dragões Fonte: FC Porto
    Yacine Brahimi é o artista que mais pinceladas de magia aplica na boa época dos dragões
    Fonte: FC Porto

    Em Portugal, o verdadeiro “número 10” não existe. Melhor, existe e está escondido, fora da sua posição. O caso mais evidente é o argelino do FC Porto, Yacine Brahimi. Confere imprevisibilidade à manobra ofensiva dos dragões como não se via desde James Rodrígues, provavelmente. É o destaque da Primeira Liga no que toque ao drible, finta, técnica e criatividade, sem dúvida. Um pouco à semelhança de Gelson Martins, futebolista do Sporting CP, mas beneficia ainda de uma bela visão de jogo e assertividade no passe que lhe permitiria desempenhar um papel no meio campo sem qualquer problema.

    Outro dos “números 10” disfarçados no nosso campeonato parece-me ser Daniel Podence. São 162cm de qualidade refinada. Ora no apoio a Bas Dost, ora a cair para uma das alas, desempenharia, sem limitações, o papel que aqui é discutido. Mantém a bola demasiado perto do pé para que o defesa a roube, mas suficientemente longe do mesmo para que a qualquer momento possa fazer o último passe. Por momentos, e não fosse a cor da camisola, lembra Leo Messi a estrear-se no Dragão, em 2003.

    Daniel Podence revela-se mais um dos bons frutos da Academia de Alcochete Fonte: Sporting CP
    Daniel Podence revela-se mais um dos bons frutos da Academia de Alcochete
    Fonte: Sporting CP

    Se o encararem como avançado, dirão que lhe falta golo, mas se o virem como um possível “número 10” só terão elogios para lhe atribuir. Tem criatividade, define bem na altura de assistir, finta facilmente e é imprevisível; tudo o que se pede para esta posição. Há espaço para melhorar, como em todos os casos, mas para isso também tem o tempo do seu lado; tem apenas 22 anos, vem da academia dos verde e brancos e é presença assídua nas convocatórias da seleção sub-21.

    Muitos destes atletas são encostados a uma linha pela capacidade de finta e aproveitamento quando driblam para dentro, em direção à baliza adversária. Muitos estarão escondidos enquanto “falsos 9” ou extremos, à espera de um treinador que o perceba e os coloque na posição correta. Por vezes, a noção desta capacidade até existe, o problema é adaptar a restante equipa a este jogador. E será sempre mais fácil e rentável ter 10 jogadores nas suas posições corretas e adaptar um “10” do que transformar o resto da equipa para que o “vagabundo” sobressaia.

     Foto de Capa: Facebook Oficial de James Rodriguez

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    Diogo Pires Gonçalves
    Diogo Pires Gonçalveshttp://www.bolanarede.pt
    O Diogo ama futebol. Desde criança que se interessa por este mundo e ouve as clássicas reclamações de mãe: «Até parece que o futebol te alimenta!». Já chegou atrasado a todo o lado mas nunca a um treino. O seu interesse prolonga-se até ao ténis mas é o FC Porto que prende toda a sua atenção. Adepto incondicional, crítico quando necessário mas sempre lado a lado.                                                                                                                                                 O Diogo escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.