Ganhar jogos e ganhar títulos

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    Começo este texto com uma declaração de princípio: este FC Porto, versão 2015/2016, intriga-me. Não o digo apenas pela irregularidade exibicional evidenciada pela equipa, até porque isso já vem da época passada; falo, sim, da incapacidade que ainda tenho, volvidos quase três meses desde o início da competição, de fazer considerações aprofundadas sobre o rendimento dos jogadores. Uma intriga que teve, como último capítulo, o jogo do passado domingo, frente ao Sp. Braga do nosso velho conhecido Paulo Fonseca. Ao longo dos últimos dias, a secção do FC Porto no Bola na Rede foi acumulando textos com argumentos diversificados sobre o que se tinha passado no Dragão. Mais do que analisar, à luz do que vi e do que li, aproveito este artigo para colocar em cima da mesa uma equação que me parece bem mais interessante de ser discutida.

    Como provavelmente já terá percebido, remeto o próximo tópico para o título escolhido para este artigo. A dicotomia entre ganhar jogos e ganhar títulos, duas realidades que se complementam mas que estabelecem, à sua maneira, a diferença entre as boas e as grandes equipas. Essa é, porventura, uma das razões que me faz ter tantas dúvidas sobre o futuro deste novo FC Porto de Julen Lopetegui. Parece claro que, com mais ou menos rotatividade à mistura, o treinador espanhol já encontrou um onze base, onde a composição do meio campo se torna fundamental. Percebe-se que, na posição 6, Rúben Neves será o homem das guerras e Danilo Pereira o das batalhas esporádicas. Nesta dinâmica, a luta entre a qualidade em posse de Rúben e o jogo posicional de Danilo estará sempre na cabeça de Lopetegui. Nos restantes vértices do triângulo, as dúvidas parecem menores: Imbula, até pelo valor que custou e pelo rendimento que o clube quer tirar dele, tem lugar garantido; André André é, há muito, o único motor da equipa.

    Tal como já escrevi , creio que será por aqui, para o bem e para o mal, que a época do FC Porto se vai decidir. E, para o explicar, é impossível não olhar para trás e perceber, na ótica de Lopetegui, a diferença entre o miolo portista da última época e aquele que temos agora. Casemiro, Herrera e Oliver fizeram, salvo alguns momentos, uma época de qualidade. A meu ver, a solidez que este trio foi ganhando ao longo da temporada teve que ver com a definição clara do modelo e dinâmica que Lopetegui queria de cada um dos elementos. Casemiro é, porventura, um dos médios defensivos que mais cresceu no futebol europeu em tão pouco tempo. Herrera, para o bem e para o mal, foi sendo, à sua maneira, um número 8 para todas as ocasiões, apesar da inenarrável inconsistência exibicional. Oliver Torres, com uma qualidade inegável ao nível do passe, foi sendo não raras vezes o abre latas que o FC Porto precisava em jogos complicados do campeonato.

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    André André tem sido uma das revelações da época portista
    Fonte: desporto.sapo.pt

    Vejam, então, o panorama que temos esta época: Rúben Neves, posicionalmente, é um jogador ainda com todo o futebol para conhecer. A qualidade técnica está toda lá mas percebe-se que, nos jogos de maiores exigência – sobretudo na Liga dos Campeões – Lopetegui dificilmente lhe dará todo o trabalho naquela zona do terreno. Também por isso é que em Kiev, por exemplo, a fórmula dos quatro médios voltou. No caso de Imbula o caso ainda é mais bicudo. Ao ver o “velho” Imbula do Marselha, percebe-se que o jogador agora está moldado a uma outra dinâmica. É certo que, de vez em quando, ainda lhe veem à memória aquelas arrancadas que fizeram dele um médio tão apetecível para os grandes clubes europeus; mas, por agora, tendo em conta o estilo que Lopetegui prefere, é mais normal vê-lo a não arriscar mais do que um passe curto.

    Não quero, com esta análise, que pense que prefiro um ou outro tridente. À sua maneira, creio que o da época passada e o desta época têm vantagens e desvantagens. Mas, também por isso, é que escolhi usar como título deste texto a expressão “ganhar jogos ou ganhar títulos”. Na temporada passada, critiquei Lopetegui por não conhecer o futebol português. À custa disso, o FC Porto perdeu pontos onde não podia e falo, por exemplo, dos jogos com Boavista, Estoril ou Nacional. Por rotações sem sentido e experiências sem razão, perdeu-se um campeonato que estava à mão de semear. Isto para dizer que, e escrevi-o várias vezes, que o problema da falta de títulos no ano transato teve mais que ver com o guitarrista do que propriamente com a guitarra.

    A razão para essa conclusão tem que ver sobretudo com a qualidade dos protagonistas. Uma das teorias que mais tenho contestado é a de que o FC Porto tem um plantel extraordinário e que bate aos pontos o de Benfica e Sporting. Em outros momentos, já procurei desmontar essa tese que, a meu ver, objetivamente nada tem de verdadeira. E isso prende-se, a meu ver, com a falta de “coisas diferentes” que este plantel tem. Falo, claro, de imaginação, que é tão precisa em certos momentos da época. Num campeonato como o nosso, a esmagadora maioria dos jogos ganha-se com transpiração. Algo que, na época passada, foi faltando a alguns jogadores do FC Porto. Por serem atletas de um outro “calibre competitivo”, tendo em conta o passado enquanto futebolistas; percebeu-se não raras vezes que o espírito de sacrifício que se exigia nem sempre surgia.

    A diferença está, depois, no reverso da medalha. Falo, claro, daquela pequena percentagem que é igualmente importante. Talvez numa proporção bem menor mas que por vezes diferencia uma boa de uma má temporada. Nesta equação de “95 % de transpiração e 5 % de inspiração”, parece-me claro que o FC Porto desta época é um espelho comparativamente ao da época passada. Há alguns meses, no esquema de Lopetegui, a qualidade exibicional aparecia e por isso é que as goleadas eram frequentes. Nos jogos em que era preciso derrubar verdadeiras muralhas, lá apareciam os “jogadores de valor acrescentado” como Danilo, Oliver ou Jackson.

    Peças que já não existem e que tornam a equipa deste ano uma imagem completamente distinta. Na luta entre a técnica da força e a força da técnica, parece claro que, ao longo do ano, se verá muito mais suor do que criatividade. Por isso, numa liga tão bipolar como a nossa entre grandes e pequenos, tenho dúvidas se, quando for preciso ganhar jogos decisivos, o FC Porto seja capaz de o fazer. Nesses momentos, só a transpiração e a crença não chega. Vai ser preciso o resto, ou seja, aquilo que diferencia as boas das grandes equipas. A mim, resta-me esperar para ver.

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