O futebol está recheado de momentos que, seguramente, nunca abandonarão a memória do mais aficionado dos adeptos. A Liga dos Campeões, em particular, tem sido palco de diversas batalhas com contornos épicos sendo que, provavelmente, aquela que todos recordarão melhor (por ser a mais recente) é a da final que opôs o AC Milan ao Liverpool FC, em 2005, com vitória dos britânicos após a marcação de grandes penalidades.
Contudo, há um outro jogo que fica para a história por diversas razões: pelo estádio em que foi disputado, pelo árbitro que dirigiu o encontro, pelas qualidade dos futebolistas que pisaram o relvado e, acima de tudo, pela incerteza no resultado e pela verdadeira loucura dos adeptos nas bancadas. Foi em 1999, no mítico Camp Nou, que Pierluigi Collina dirigiu uma final relativamente à qual acabaria por descrever o ruído dos adeptos no fim do encontro como “o rugido de um leão”. Frente a frente, duas das melhores equipas do mundo, Manchester United FC e FC Bayern Munchen, comandadas por dois grandes treinadores (Sir Alex Ferguson e Ottmar Hitzfeld, respetivamente).
Os onzes iniciais eram verdadeiros desfiles de estrelas. O Manchester United FC apresentou-se em campo com Peter Schmeichel na baliza, uma defesa a quatro composta por Gary Neville, Ronny Johnsen, Jaap Stam e Denis Irwin, um meio-campo composto por Nicky Butt, David Beckham, Jesper Blomqvist e Ryan Giggs, e a frente de ataque entregue à temível dupla formada por Andy Cole e Dwight Yorke. Na equipa britânica destacavam-se as ausências, por castigo, de duas peças influentes no meio-campo: Roy Keane e Paul Scholes. Já o FC Bayern Munchen entrou em campo com Oliver Khan na baliza, Lothar Matthaus como líbero, Markus Babbel, Samuel Kuffour, Thomas Linke e Michael Tarnat na linha defensiva, Jens Jeremies e Stefan Effenberg no meio-campo, e uma frente de ataque entregue ao trio formado por Mario Basler, Alexander Zickler e Carsten Jancker. Também a equipa alemã partia para a final com duas ausências, nesse caso por lesão, do avançado brasileiro Élber e do lateral esquerdo francês Bixente Lizarazu.
Início do jogo e, logo aos seis minutos, num livre apontado junto à área, do lado esquerdo, Mario Basler colocou a formação alemã em vantagem. Após um madrugador balde de água fria para os britânicos, o Manchester United FC começou a mandar no jogo mas, pese embora o esforço de David Beckham (a alinhar numa posição central), faltou sempre criatividade à equipa, que se ressentiu significativamente da ausência de Paul Scholes. Beckham foi sempre bem marcado por Jeremies e a linha defensiva do Bayern foi também sempre competente nas suas funções, anulando quase por completo Andy Cole. Assim, acabaria por ser Ryan Giggs, colocado a jogar na ala direita (contrariamente ao esperado), a causar alguns dos principais desequilíbrios face às dificuldades sempre sentidas por Michael Tarnat. Contudo, o FC Bayern Munchen era cada vez mais perigoso no contra-ataque e Carsten Jancker ia colocando a defesa do Manchester United FC em constante sobressalto.
Na segunda parte os alemães regressaram mais fortes e com maior controlo sobre o jogo. Percebendo que a sua equipa necessitava de mais poder de fogo na frente de ataque, Sir Alex Ferguson chamou a jogo Teddy Sheringham para o lugar de Jesper Blomqvist. Porém, foi o Bayern que, por intermédio de Mehmet Scholl (entrado para o lugar de Zickler), mais perto esteve do golo: chapéu (quase) perfeito ao gigante Peter Schmeichel, que apenas parou no poste direito da baliza do Manchester United FC. Sir Alex Ferguson chamava então a jogo, para os 10 minutos finais, Ole Gunnar Solskjaer (para o lugar de Andy Cole) mas, mais uma vez, foi o Bayern que esteve próximo de sentenciar o jogo: após alguns ressaltos na área, Jancker fez um pontapé acrobático que esbarraria na barra da baliza à guarda de Schmeichel.
Nervos à flor da pele em Camp Nou até que, aos 91 minutos de jogo, Teddy Sheringham fez o golo do empate após desviar à boca da baliza uma bola rematada por Ryan Giggs. O Manchester United FC estava então por cima do encontro e, enquanto os adeptos ainda festejavam o golo do empate, o impensável aconteceu: aos 93 minutos, novo canto para a formação britânica apontado por David Beckham, Sheringham “penteia” a bola na grande área e, já na pequena área, Solskjaer desvia a bola para o fundo da baliza à guarda de Oliver Kahn. Festejos efusivos de Peter Schmeichel, loucura nas bancadas de Camp Nou, uma final feita de história e para a história!
A partir desse dia o futebol nunca mais seria o mesmo. A ideia de que o jogo apenas termina quando o árbitro apita foi exponenciado ao máximo e, atualmente, a reviravolta épica protagonizada pelo Manchester United FC de Sir Alex Ferguson é frequentemente apontada como exemplo ilustrativo dessa popular expressão. Porém, melhor do que recordar por palavras é assistir às imagens arrepiantes de um daqueles encontros que, mesmo para quem não gosta de futebol, fazem deste um desporto mágico.
Foto de Capa: Manchester United FC